A Páscoa, seus significados e a visão Espírita sobre a celebração
Por Nice Almeida – 25/03/2023
“Tenho desejado ansiosamente comer convosco esta Páscoa, antes do meu sofrimento".
O autor desta frase é Jesus e ela está registrada no Livro de Lucas, capítulo 22, versículo 15, no Novo Testamento da Bíblia. Era o momento em que Ele iniciava sua despedida do convívio carnal com seus discípulos e todo o povo judeu.
Preparava-se o Cristo para a crucificação em um cenário onde os judeus celebravam a Páscoa, uma tradição iniciada entre os hebreus bem antes da vinda de Jesus à Terra e contada no livro do Êxodo, capítulo 12 - no Antigo Testamento da Bíblia -, quando Moisés, “o profeta divinamente designado para liderar a partida dos hebreus rumo à terra prometida”, libertou àquele povo da escravidão do Egito.
E é exatamente a passagem de Jesus pela Terra que divide essa celebração religiosa em dois grandes momentos da história, com significados diferentes.
A Páscoa hebraica e a Páscoa Cristã
A palavra Páscoa tem origem em dois vocábulos hebraicos: um, derivado do verbo pasah, quer dizer “passar por cima”, outro, traz raiz etimológica de pessach (ou pasha, do grego) indica apenas “passagem”.
Estavam os hebreus, conforme narra a Bíblia, a caminho da libertação após mais de 400 anos de escravidão. Deus preparava o último grande sinal que levaria o Faraó a finalmente permitir que Moisés deixasse o Egito tirando todo o seu povo do cativeiro egípcio.
Era chegado o momento da concretização da chamada décima praga. O sinal anunciava a passagem de um anjo da morte que levaria ao desencarne todos os primogênitos das famílias que não marcassem os umbrais de suas portas com o sangue do cordeiro sacrificado.
Antes que isso acontecesse, os hebreus deveriam preparar o que se consagrou a Festa dos Pães Asmos, ou o início da Páscoa.
“Quando vossos filhos vos perguntarem: que rito é este? Respondereis: É o sacrifício da Páscoa ao Senhor que passou por cima das casas dos filhos de Israel no Egito, quando feriu os egípcios e livrou as nossas casas. Então, o povo se inclinou e adorou”. (Êxodo, 12:26-27)
Eis na passagem histórica do Antigo Testamento o primeiro significado da Páscoa. A libertação do povo hebreu que celebrou a saída do Egito rumo à Terra Prometida.
Jesus, um novo sentido para a Páscoa
A passagem de Jesus pela Terra e sua crucificação exatamente no momento em que a Páscoa era celebrada deu um novo sentido à comemoração. A partir deste fato, a denominada Páscoa Cristã ressignificou a data, porque o Cristo passou a ser a figura central da celebração.
A doutora em História e mestre em História Social, Nathany Andrea Wagenheimer Belmaia, descreve em artigo intitulado “Do Pessach à Pascha: ressignificação dos significantes da Páscoa judaica pela Páscoa cristã” as significâncias dos dois momentos. O da Páscoa Hebraica e o da Páscoa Cristã.
“Enquanto a Páscoa judaica era libertação dos escravos políticos e econômicos que formaram Israel, a Páscoa de Jesus reivindicava a libertação de ‘todas as escravidões’, de toda a culpa e todo o pecado e a elevação de todos à qualidade de filhos do pai celeste e herdeiros da vida eterna pelo sacrifício de Jesus, cuja divindade fora atestada com a ressurreição depois da morte na cruz.” [1]
O professor doutor Severino Celestino, pesquisador do hebraico e das religiões, também atesta essa mudança de significado da Páscoa quando, em artigo publicado no site Portal do Espírito, diz:
“O exemplo de Cristo ganhou maior significação, porque o ritual da Páscoa já existia no judaísmo. Agora depois de Jesus, com o seu maior exemplo de amor, como o filho de Deus, a festa ganha um novo significado. Jesus conseguiu inovar e acrescentar novos valores à Páscoa judaica.” [2]
Portanto, a Páscoa Cristã celebra o momento da morte e ressurreição de Cristo, refletindo sobre tudo que foi vivenciado e dito durante a passagem de Jesus pelo planeta Terra.
Espíritas comemoram a Páscoa?
Em recente palestra virtual no canal do YouTube do Centro Espírita “O Consolador”, Válnia Veras, da Associação Espírita Chico Xavier, explicou que os espíritas não são contrários a celebração da Páscoa. No entanto, como a Doutrina Espírita não segue rituais, a data como é entendida no Cristianismo não é comemorada. Diz a palestrante:
“A Doutrina Espírita não fala nada com relação à comemoração da Páscoa, porque não existem rituais. A Doutrina Espírita não adota rituais. Nós espíritas, geralmente, não comemoramos a Semana Santa, como é conhecida no Brasil pelos cristãos, principalmente pelos católicos. Não que sejamos contra, mas é que não faz parte do tipo de comemoração que a gente tem, devido à questão do ritual.” [3]
A explanação de Válnia Veras é corroborada pelo professor doutor Severino Celestino, que acentua a definição de Páscoa para os espíritas no mesmo artigo citado anteriormente.
“O espiritismo enaltece e concorda com os exemplos deixados por Jesus, humildade, servidão, doação e amor e ainda considera que o importante na Páscoa não é a morte de Jesus, que é tão evidenciada.
Entendemos que a grande mensagem deixada por Jesus para nós, na Páscoa, é sua ressurreição, é Ele voltando dentre aqueles que pareciam estar mortos, para nos dizer que a morte não existe. [...]” [2]
Celestino encerra levando todos a refletirem sobre o que vem após a morte física, tal qual Jesus nos mostrou quando foi levado à cruz: “além da morte do corpo físico existe um horizonte muito maior do que podemos imaginar a nos esperar em espírito e nós quase sempre, esquecemos disto”.
Referências
[1] VIEIRA, 2010 apud BELMAIA, Nathany Andrea Wagenheimer. Do Pessach à Pascha: ressignificação dos significantes da Páscoa judaica pela Páscoa cristã. Antíteses, Londrina, v. 10, n. 19, p. 542-564, jan./jun. 2017. Disponível em: https://www.redalyc.org/pdf/1933/193351879025.pdf.
[2] SILVA, Severino Celestino. A Festa da Páscoa. Portal do Espírito, 2017. Disponível em: https://espirito.org.br/artigos/festa-da-pascoa/.
[3] OCONSOLADORJPA. O significado da Páscoa no tempo de Jesus. YouTube, 2023. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=kGIhGOzZ3No.